Neste início de ano letivo a
turma do 9° ano do ensino fundamental II dará início aos estudos sobre a
Proclamação da República Brasileira. Diante das manifestações que acarretou no golpe
de estado, que pôs fim a monarquia brasileira, há importantes questionamentos principalmente
sobre a participação da população. Para tanto, o texto abaixo de Emília
Viotti da Costa subsidia dados importantes para a investigação do tema.
Confira.
A Proclamação da República
(Texto de Emília Viotti da Costa)
"A Proclamação da República não resultou de uma revolução, mas de
um golpe militar. Isso não quer dizer que não tenha havido um conteúdo
ideológico no golpe. Este, no entanto, foi produto da ação de homens
pertencentes às classes média e alta, pequenos comerciantes, advogados,
jornalistas, professores, médicos, alguns fazendeiros progressistas e oficiais
do Exército que adotaram ideias republicanas, filiaram-se ao partido
republicano e empenharam-se desde sua fundação, nos anos 70, em fazer críticas
à Monarquia e propor em seu lugar um regime republicano. Apesar dos seus
esforços, no entanto, a República resultou não de um movimento popular, mas de
uma conspiração entre uma minoria de republicanos civis e militares.
Para se entender as razões que
moveram esse punhado de homens a derrubar a Monarquia não basta referirmos a
suas ideias republicanas. É preciso explicar por que essas ideias, presentes no
Brasil antes mesmo da Independência, só então se concretizaram. Por que a
Monarquia foi derrubada sem que ninguém pegasse em armas para defendê-la? As
respostas a essas questões encontram-se na falta de flexibilidade e
adaptabilidade do sistema político existente em face das mudanças profundas que
ocorreram no país no decorrer do século XIX e o desgaste da Monarquia.
A Monarquia sempre fora uma
anomalia na América. Todos os demais países adotaram o regime republicano por
ocasião da Independência. Circunstâncias históricas excepcionais: a invasão de
Portugal pelas tropas napoleônicas e a transferência da Corte portuguesa para o
Brasil em 18O8, a Revolução Constitucionalista do Porto, anos mais tarde,
forçando a volta de D. João VI a Portugal, ficando em seu lugar o Príncipe D.
Pedro fizeram com que o Brasil seguisse um caminho diverso dos demais países da
América. Embora houvesse republicanos no Brasil, como demonstravam os
movimentos em prol da Independência tais como a Inconfidência Mineira, a
Revolução de 1817, e as sublevações que ocorreram mais tarde durante o período
regencial, os monarquistas levaram a melhor e, com a ajuda do príncipe regente,
instituíram o regime monárquico, que duraria até 1889.
Quando Pedro I renunciou à coroa
e deixou o filho de cinco anos como seu sucessor, os políticos de então tiveram
a oportunidade de estabelecer uma república, mas preferiram manter a Monarquia
e governar em nome do jovem imperador. Quando este chegou aos 14 anos, no
entanto, apressaram-se em conceder-lhe prematuramente maioridade, na
expectativa de que sua presença na chefia do estado viesse a pôr fim à
instabilidade política que existia no país. A partir de então, Pedro II
tornou-se Imperador, embora o clima de insatisfação e faccionalismo
continuassem. Somente a partir de 1848, com a derrota dos praieiros, a Monarquia
se consolidou no país.
Criou-se um regime altamente
centralizado, elitista, e oligárquico, um sistema bicameral, com um senado
vitalício e uma câmara renovável periodicamente. O regime era pouco
representativo. Apenas uma minoria possuía o direito de voto. Ficaram excluídos
os escravos, as mulheres e a maioria dos trabalhadores e todos os que não
possuíam renda mínima estabelecida por lei. As eleições eram indiretas, isto é,
os votantes qualificados como tal escolhiam os eleitores e estes votavam nos
candidatos. O resultado é que durante todo o Império o corpo eleitoral
correspondia a uma porcentagem mínima da população. Além disso, a fraude
eleitoral era generalizada. Pela carta constitucional outorgada por Pedro I
após a dissolução da Assembleia Constituinte, o Imperador possuía o Poder
Executivo e o Poder Moderador que além de outras atribuições permitia a ele
interferir no Poder Legislativo, dissolvendo a câmara e convocando novas
eleições. Dois partidos: o conservador e o liberal alternavam-se no poder,
dependendo dos resultados eleitorais. Entretanto, quando o Imperador usava do
Poder Moderador convocando novas eleições e estas resultavam na queda do
partido que estava no poder e na vitória da oposição, os primeiros queixavam-se
da interferência do Imperador. Através desse processo o Imperador atraiu muitos
inimigos e a Monarquia desmoralizou-se.
A existência de um Conselho de
Estado também vitalício e nomeado pelo imperador, com o objetivo de
assessorá-lo em questões vitais para a nação, também criou resistências. Dessa
forma, a organização política vigente no Império levava a um desgaste
inevitável do imperador e da Monarquia. Já nos fins da década de 70 começaram
os ataques ao regime e o partido republicano foi criado.
A Guerra com o Paraguai
contribuiu ainda mais para desgastar o governo e irritar as forças armadas, que
sofreram sérias perdas, sentiram o seu despreparo e se ressentiram da
interferência dos políticos civis. O positivismo e o republicanismo cresceram
entre os militares. Ao mesmo tempo, a interferência do governo na vida
eclesiástica e religiosa, em virtude do direito que lhe fora conferido pela
constituição, fez multiplicar os conflitos com a Igreja, base natural da
Monarquia. Ao mesmo tempo, levas de imigrantes protestantes que chegavam ao
país constituíam um desafio aos privilégios da Igreja Católica que até então
monopolizava a educação, presidia os casamentos e controlava os cemitérios.
Crescia o número daqueles que desejavam a separação entre Igreja e Estado. O
número de descontentes aumentava.
O desenvolvimento econômico do
país criava novas oportunidades de investimento na construção de estradas de
ferro, nas indústrias, no comércio interno, no sistema bancário, nas companhias
de seguros. No entanto, apesar das reformas eleitorais, a fraude eleitoral e a
falta de representatividade continuavam. Estas somadas à vitaliciedade do
Senado e ao Conselho de Estado garantiam a sobrevivência das oligarquias
tradicionais dificultando a renovação dos grupos dominantes mantendo
marginalizada a maioria das classes subalternas. O desequilíbrio entre o poder
econômico e político e os conflitos de interesse entre as províncias alimentava
o número dos que condenavam a excessiva centralização e almejavam a federação.
Foi dentro desse clima de
descontentamento crescente que o movimento abolicionista e as ideias
republicanas ganharam expressão política. Conquistada a abolição só restava dar
o golpe final à Monarquia, que se revelou incapaz de realizar as reformas
almejadas.
Proclamada à República aboliu-se
a vitaliciedade do senado, eliminou-se o Conselho de Estado, decretou-se a
separação da Igreja e do Estado, adotou-se o regime federativo e instituiu-se o
sufrágio universal, excluindo, no entanto, as mulheres do direito de voto.
Aboliram-se os títulos de nobreza. A família real foi exilada.
A fraude eleitoral e o domínio
das oligarquias persistiram. Para muitos a República foi um desapontamento.
"Essa não era a república de meus sonhos", expressão atribuída a um
republicano, simboliza a situação em que se acharam todos aqueles que almejavam
uma República mais inclusiva e democrática."
Referência: